Quem anda aqui por mais tempo deve ter achado estranho eu não ter falado nada sobre o dia dos professores, já que eu fiz magistério e minha mãe é professora aposentada. Mas era por um motivo especial, queria ter um tempo para escrever sobre a professora da minha vida.
No dia dos professores li em algum instagram que as mães são todas professoras e são mesmo, e eu tive a sorte de ter uma professora em dose dupla.
A minha mãe desde sempre quis me ensinar tudo certinho e chegava a ser chato (agora eu vejo que não) "Fulana, vai com nós!" "Sabrina, é CO-NOS-CO!" "Tá bom, mãe! Vai CO-NOS-CO!"
E aos poucos o "com nós" perdeu espaço e o "conosco" foi aprendido e nunca mais esquecido.
A minha mãe foi a minha professora de bicicleta, de patins, de perder o medo e vejo que hoje faço o mesmo com a Maria Luísa.
Mas ao mesmo tempo eu tinha que dividir a minha mãe com mais tantas outras crianças. Minha mãe saía cedo de casa para dar aula e eu ficava com a minha vó, não lembro de quantas vezes ela teve que sair de casa comigo chorando por querer ir junto. Mas os anos foram se passando e eu não chorava mais, mas mesmo assim não quer dizer que fosse fácil.
Quando cheguei na 3ª série, minha mãe também era professora de uma 3ª série em outra escola e eu queria muito ser aluna dela, chorei, pedi, incomodei. Acho que a minha mãe até pensou em me trocar de escola para que eu não a incomodasse mais, mas ela forte disse não, pois sabia que não seria o melhor e eu continuei na minha escola. Porém, não foi fácil, eu inventava dores (mas eu realmente as sentia) para não ir para a escola, reclamava, chorava... Mas ela sempre foi forte. Até que o mais legal aconteceu, ela trocou material de ensino com a minha professora e eu achei aquilo o máximo. Falava para todos os colegas que aquelas folhas mimeografadas (sim, sou velha) eram feitas pela minha mãe.
Anos depois essa professora da minha vida recebeu uma missão que ninguém queria pegar, assumir uma escola da zona rural de Rio Grande que tinha uma sala com 4 turmas de séries diferentes. Pois é, ela daria aula para 4 turmas diferentes, em uma única sala, com 2 quadros para que metade da turma ficasse virada para um lado e a outra metade para o outro lado. E não é que ela aceitou! E abraçou aquilo como uma grande missão.
No começo o negócio não foi fácil, mas ela notou o quanto aquela comunidade era carente. Muitas professoras tinham passado por lá, mas poucas abraçaram a causa, apenas tratavam aqueles alunos como mais uns que passariam por ali, mas ela chegou lá com outra visão.
Ela chegou lá com o problema de espaço e também de ensino, algumas crianças já estavam na primeira série durante alguns anos e as professoras que passaram por lá só esperavam o momento dessas crianças desistirem. Mas isso não acontece com a Professora Mary.
Gente, eu vi a minha mãe se desvirando em mil para ensinar essas crianças. Quando elas começavam a mostrar algum desenvolvimento no ensino ela vibrava como se fosse com ela. Vi um relato de uma aluna dela nesse último dia 15 que lembrava exatamente como ela a ensinava a separar as sílabas e ela tinha feito o mesmo comigo quando eu precisei aprender "toda vez que precisares respirar na palavra, existe uma separação de sílaba", parece bobo, mas tente fazer com calma que verás que é simples, mas verdadeiramente útil para uma criança de 7 anos.
Lembram que eu disse que ela aceitou uma missão, então só isso era pouco para ela. Ela aumentou a sua carga horária na escola, conseguiu dividir a turma e acrescentar uma professora. Então, já tínhamos 4 turmas divididas entre duas professoras e em horários diferentes. Opa, eles já eram crianças de escolas normais. Ahhh e ainda começaram a ter uniforme escolar.
Sim, a gente lá em casa sofreu um pouquinho, eu subi o cargo de irmã mais velha, para responsável pelo meu irmão. Eu tinha que dar almoço, aguentar as incomodações dele, mas tudo valia a pena, pois a minha mãe estava nos ensinando algo muito importante, nunca desistir quando aparecer qualquer desafio na nossa vida.
Aos poucos essa escola lá da zona rural foi crescendo, minha mãe fazia festas de final de ano, com direito a Papai Noel e distribuição de brinquedos. Depois começaram as viagens e tudo era uma festa e a escola esquecida crescia.
E a escola foi crescendo em tamanho, a tal da baixinha resolveu que queria aumentar a escola, pois sabia que precisava de outras salas e foi a maior briga naquela secretaria de educação, mas ela conseguiu. Cada turma já tinha sua própria sala, aos poucos mais professoras chegaram e ela ainda conseguiu fazer com que a escola não fosse somente de 1ª à 4ª série, mas da pré-escola à 4ª série.
Todo mundo já conhecia a Mary, ela chegava na secretaria e já começavam "Fala Mary, o que queres?" Sim, ela pedia muito, muito mesmo, pois tudo era para os alunos dela. A escola dela ficou uma casinha de bonecas e aos poucos a escola que ninguém queria começou a ser olhada com outros olhos e vocês já imaginam, né...
O que aprendemos nesses anos que a minha mãe trabalhou na Ilha dos Marinheiros que quando fazemos tudo com o coração, tudo será recompensado e não por dinheiro, mas por amor, carinho e gratidão.
Quando a minha mãe teve câncer de mama, a Ilha inteira soube e se mobilizou, minha mãe contou com a boa ação de pessoas que por vontade própria foram atrás para ajudá-la para que ela não precisasse arcar com nada em suas despesas médicas. Lembro dela chegando uma vez na clínica que fez as cirurgias com um saco de moedinhas e ela não teve vergonha nenhuma de entregá-las, pois ali elas transmitiam todo amor que recebeu.
Quase enlouqueci depois das duas cirurgias que ela precisou fazer, pois o pessoal ia visitá-la e como só tinha barco para a travessia ou no começo da tarde ou no final da tarde, eles chegavam 1 hora da tarde e ficavam até 5h e nós os recebíamos da melhor forma possível. Eu era adolescente e no começo achava isso super chato, mas aos poucos fui entendendo que isso era carinho e gratidão a uma pessoa que os ajudou, que corria atrás do que eles precisavam.
Quando minha mãe voltou ao trabalho, lembro dela me dizer com lágrimas nos olhos "Sabrina, uma senhora que eu nunca tinha visto veio falar comigo logo que coloquei o pé na Ilha dos Marinheiros e me disse. Graças a Deus a senhora está bem! Rezei tanto pela sua recuperação!" Gente, uma pessoa que ela não conhecia, vocês imaginam como um coração pode encher de amor?!
Até hoje ela é a Professora Mary, os alunos e os pais das crianças tem a maior admiração por ela, sempre fazem questão de vir falar com ela se a encontram na rua. Naqueles olhares tu aprendes que não existe dinheiro que pague o que se faz com amor e dedicação, é o amor que paga o amor.
A minha mãe é a professora da minha vida, pois mesmo sabendo que o salário não é o que motiva, o aprendizado de cada criança, a felicidade em seus rostos, paga tudo.
Espero que os nossos filhos encontrem professores tão compromissados com a profissão que escolheram como a minha mãe. Que todos vejam seus alunos como filhos e deem todo o carinho que eles precisam no momento que estão junto deles.
Feliz dia do professor a todos que amam o que fazem!!! E espero que um dia eles também sejam recompensados financeiramente, pois por causa de um professor eu posso escrever esse texto e tu podes lê-lo.