Adeus a um amigo


Penso que nunca imaginamos o momento de darmos adeus a um amigo, já tive perdas durante a vida de amigos queridos, mas em nenhuma vez cogitei, tão cedo, dar um até breve à minha melhor amiga, como precisei fazer no último dia 24 de outubro.
Notei que as pessoas muitas vezes se impressionam mais e acham que teu sofrimento é maior quando informas que foi um primo, um tio ou qualquer parente que faleceu do que um amigo. E assim pensei em toda minha vida junto com a amiga, que durante 23 anos foi e é a minha melhor amiga, nas milhares de vezes que estava ao meu lado e não qualquer parente meu.

Esse texto é o meu até logo a ela e uma mensagem da importância do valor de uma amizade.

A Marília chegou na minha vida quando eu tinha apenas 9 anos, ela é o elo da minha infância, adolescência e fase adulta. Com ela a vida me mostrou que eu não precisaria estar sempre ao lado fisicamente para me fazer presente na vida de alguém, eu entendi que uma ligação, uma mensagem, podem fazer mais diferença do que morar perto. 
Nós nos conhecemos na escola, na 3ª série, e ela já chegou causando, numa aula cortou 3 dedos com a tesoura (claro, que sem querer). Eu sentava ao lado dela e ela só me olha e diz "cortei meus dedos", quando ela levanta eu só vejo o rastro de sangue. Sim, contamos essa história milhares de vezes.  Mas não ficamos grudadas desde o início, mas aos poucos notamos que chegavam, passavam e saíam "amigas" e nós ficávamos sempre uma ao lado da outra. 

Beto Carrero/Olinda

A Marília foi a única que soube que no dia que a maioria das meninas resolveu ficar pela primeira vez, eu fingi que beijei o menino, pois eu tive nojinho. E também foi a primeira a saber quando eu beijei de verdade. 
Foi com ela que eu depilei as pernas pela primeira vez, as duas escondidas no tanque, nos fundos da casa dela na praia do Cassino. Também nessa mesma época, com 12/13 anos, fomos "fugidas" e sozinhas até a praia e voltamos correndo a tempo de ninguém nos pegar. Algo que não conseguimos fazer aos 16, quando fomos também fugidas para um Luau. O pai dela nos pegou chegando em casa na caçamba do carro de um conhecido. 
Não adiantava, as circunstâncias da vida teimavam em nos distanciar, mas só conseguiam fisicamente, nunca conseguiu separar as nossas almas. Depois de um verão grudadas, de muitas ligações e risadas, na 7ª série ela trocou de escola. Assim, os novos colegas e amigos dela se tornaram também os meus colegas e amigos. 
Depois ela foi embora de cidade e o que parecia que iria ficar impossível de manter, não foi, mesmo eu também tendo mudado de casa e ficado sem telefone.
E no meio do 1º ano do 2º grau, ela volta pra Rio Grande e eu volto a morar perto dela. E nesse momento descobrimos que não tinha mais jeito, nossa vida era para ser sempre uma grudada à outra. 
Demos muitas risadas, entramos no MIRC na madrugada, encontramos paquerinhas, vestimos azul por um tempo (blusas, chinelo...), fizemos aula de crochê no verão com senhorinhas de 60 anos, passamos o cabelo com ferro quando ainda não tínhamos chapinha, emprestamos roupas, amamos Legião Urbana, brigamos, sim, brigamos algumas vezes, mas vimos que era muito chato viver longe uma da outra, entendemos que outras pessoas entrariam nas nossas vidas, mas que o que tínhamos uma com a outra nunca mudaria. 
Não passamos só por momentos de alegria, quando eu tinha 19 anos minha mãe descobriu um câncer de mama e ela foi uma das amigas que mais ficou ao meu lado. Era a que perdia tardes de estudo me abraçando e me consolando dizendo que tudo ia dar certo. Naquela época, eu tive que assumir as responsabilidades de casa, não teve nenhum parente que disse "deixa que eu cuido de vocês, enquanto a mãe se recupera", por muitas vezes só os meus amigos sabiam o que eu passava diariamente. E ao meu lado ela viu a recuperação e a vitória da minha mãe. 
Assim fomos crescendo e entramos no mesmo ano na faculdade, ela em Enfermagem e eu em Direito. Aí ela viu eu encontrar o grande amor na minha vida e numa conversa ao telefone, contando que ele tinha dito que me amava e eu disse que não tinha dito o mesmo, mas fiquei falando o que eu achava dele, ela me diz "amiga, por quê tu não falou que amas ele também? Porque está na cara que também sentes o mesmo!" Pois é, foi ela que me disse que eu já amava um tal de Daniel, esse que vocês conhecem como o pai da Maria Luísa. 
Pouco tempo passou e eu que a vi encontrar o grande amor da vida dela. Depois eu casei e fui embora de cidade, de estado, ela se formou, entrou no mestrado, eu me formei e aí engravidei. 


Nunca vou esquecer quando ela e o Thiago fizeram questão de ir logo que a Malu nasceu nos visitar e ela ao ver a Maria Luísa nos meus braços começou a chorar... Pois é, "amidinha", eu tenho uma filha que também será sempre um pouco tua. 


Aquele ano de 2012 tinha tudo para ser perfeito, pois ela também ia casar, mas no meio de tudo isso veio o câncer de mama. Ela casou, mas ao mesmo tempo travou uma batalha com essa doença. 
Sabe aquela tal distância que não impedia a amizade, era cruel no quesito abraçar. Foi difícil estar longe dela fisicamente nesse momento, mas não faltaram orações que nos unissem. A doença teve altos e baixos, achamos por um tempo que a cura tinha chegado, mas infelizmente...
Foram 4 anos, mas entendam, o câncer é uma doença cruel, porém não consegue matar algo maior, o amor. Nesses 4 anos vi famílias se unirem, amigos chegarem e crenças se fortalecerem. Não ligamos para quem se distanciou, apenas agradecemos por quem chegou. 
A Marília, madrinha dos ensinamentos de Deus da Malu, nos mostrou que a fé em Deus é maior que qualquer coisa nesse mundo. E que mesmo que o milagre que esperávamos não tenha chegado da forma como gostaríamos, Ele nos deu paz, amor e união. 


Eu confesso, em nenhum momento dessa jornada eu me preparei para me despedir de ti, minha amiga, mas Deus me permitiu que nos teus últimos dias aqui na terra nós estivéssemos perto uma da outra também fisicamente e agora nesse texto eu me despeço com um até logo, te amo.

Comentários
1 Comentários

1 comentários:

  1. Sá acho que nunca estamos preparados para dar um até breve para quem é importante para nós, e mesmo não conhecendo vocês duas pessoalmente nesse texto fica mais do que claro o amor e carinho entre vocês duas .... Câncer é uma doença que judia da pessoas e de quem está ao seu redor mas tenho certeza que nessa batalha ela não esteve sozinha e o melhor recebeu (e recebe ainda tenho certeza) muito amor seu.

    Sinta-se abraçada e um grande beijo
    Mi Gobbato @espacodasmamaes

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